Nunca só essa mente, nunca só esse mundo
30 Nov 2023 – 9 Feb 2024
Abertura
30 Nov, 18h–21h
Carpintaria
Rua Jardim Botânico 971,
Rio de Janeiro
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Aislan Pankararu | Allan Weber | Amadeo Luciano Lorenzato | Anderson Borba | Antonio Tarsis | Barrão | Carlos Bevilacqua | Cristiano Lenhardt | Efrain Almeida | Erika Verzutti | Ernesto Neto | Frank Walter | Gerben Mulder | Gokula Stoffel | Janaina Tschäpe | João Maria Gusmão & Pedro Paiva | Leda Catunda | Lucia Laguna | Luiz Zerbini | Marina Rheingantz | Mauro Restiffe | Paulo Monteiro | Robert Mapplethorpe | Rodrigo Andrade | Rodrigo Cass | Rodrigo Matheus | Sheroanawe Hakihiiwe | Tadáskía | Tatiana Chalhoub | Tiago Carneiro da Cunha | Yuli Yamagata
Assim como o horizonte, que marca o ponto de encontro do céu com a terra, sem contudo pertencer completamente a nenhum dos dois, as obras aqui presentes dão forma à busca por proximidade e reciprocidade com o mundo físico. A exposição trata de estados transitivos e formulações de interstícios. Situando-se nos intervalos entre a nossa percepção imediata e a capacidade de imaginar outras cenas, o trajeto construído aqui delineia a natureza como reunião de processos de correlação entre o dado e o construído, um tecido de relações moventes. Em outras palavras, podemos acompanhar a mente tomando contato com um mundo físico, nunca só essa mente, e nunca só esse mundo.
Entre a vasta paisagem fotografada por Mauro Restiffe e a cerâmica esmaltada de Tatiana Chalhoub e o relevo topográfico de João Maria Gusmão & Pedro Paiva, temos a compressão e a expansão de horizontes díspares. Estes podem abarcar a vista, dissolver o espaço em uma ambientação vaporosa ou trazer às imediações do espectador a densidade mineral de uma cordilheira. O díptico de pintura em concreto sobre linho de Rodrigo Cass pode ser visto como o ponto terminal desse trajeto, decompondo imagens em linhas mínimas que evocam o esqueleto de montanhas, como na instalação aérea de Rodrigo Matheus.
As esculturas de Cristiano Lenhardt e Erika Verzutti cruzam a fisicalidade de seus materiais com a insistência sobre configurações cíclicas, num anel de ovos e um relevo de parede cujo amarelo vivo e motivo central circular remetem à irradiação do sol e à gema, imagens de gestação e recorrência. A escultura de parede de Anderson Borba e a assemblage de caixas de fósforo de Antonio Tarsis parecem ter sofrido a ação do tempo, como um junco que viesse do mar ou uma construção exposta aos elementos. Por outro lado, a composição têxtil de Yuli Yamagata, a imensa superfície enredada e estampada de Luiz Zerbini e as aquarelas de Barrão, produzem panoramas decompostos em objetos e contornos, reproduzindo arranjos naturais artificiosamente.
A paisagem, por um lado, é o modo como partes do mundo se conectam diante da visão, como no trajeto que leva da abstração estradeira de Rodrigo Andrade ao turbilhão de pássaros iluminados em tons dourados do histórico pintor afro-caribenho Frank Walter. Configura-se assim um arquivo sensorial das formas e contornos da natureza, um agregado de aspectos que participam de um todo contínuo. Ernesto Neto introduz no espaço o jogo de forças e contrapesos presente nos sistemas vivos, numa homenagem formal e conceitual às forças naturais modeladoras de ecossistemas. O díptico de Tadáskía, neste sentido, assinala a fluência e a mutação que o desenho tem em comum com as forças transformadoras que atuam na paisagem, convertendo o movimento tempestuoso em uma espécie de escrita.
Marina Rheingantz, Lucia Laguna e Gokula Stoffel apresentam pinturas abstratas cuja profusão de texturas e elementos pictóricos amorfos criam atmosferas em vias de dissolução, superfícies movediças carregadas de densidade psicológica. A escultura feita a quatro mãos por Borba e Erika Verzutti remete a um cruzeiro ou a um sinal fincado na terra para marcar a reverberação simbólica de um lugar. Os galhos com flores de Efrain Almeida, esculpidos em madeira de Umburana, provocam uma abertura subjetiva semelhante, em que um objeto carrega consigo toda a memória de um topos imaginário. A montagem de seis desenhos do artista Sheroanawe Hakihiiwe, por sua vez, conformam um repertório de espécies vegetais e emaranhados orgânicos, dando a ver um recorte da floresta amazônica em pictorialismos abstratos em diálogo com a cosmologia indígena.
Partindo do enquadramento parcial de uma flor em preto e branco, a fotografia de Mapplethorpe ecoa com a composição em lona de Allan Weber: os dois trabalhos produzem uma escala ambígua, entre o micro e o macroscópico, permitindo que o espectador intua uma ambientação além do quadro como, aliás, na natureza-morta de Gerben Mulder e nas paisagens em miniatura de Tiago Carneiro da Cunha e Leda Catunda. Aislan Pankararu, com sua pintura de pontos coloridos em paleta vibrante, reproduz motivos vegetais abstraídos em uma padronagem que evoca uma seção da floresta, enquanto a tela de Janaina Tschäpe, em meandros gestuais de tinta a óleo e pastel oleoso, instaura uma cena imersiva a partir de elementos abstratos, com uma qualidade cinestésica que vai do calor ao frio.
Marcando um novo desdobramento em sua obra, Carlos Bevilacqua pinta um cenário fantástico, suspenso entre a nitidez construtiva e a deriva da vista. Em suas pinturas, Paulo Monteiro trabalha com a repetição rítmica de elementos cromáticos e gráficos, levando ao aparecimento de uma ordem subjacente. O pintor histórico Amadeo Luciano Lorenzato sintetiza paisagens bucólicas caracterizadas pela imersão contemplativa no dado físico: um crepúsculo sugestivo e silencioso.
Agradecimento especial à Galeria Galatea, Fernando Ferreira de Araujo, Mendes Wood DM e Nara Roesler.