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I Could Eat You

5 Jul – 28 Aug 2022


Casa da Cultura de Comporta
R. Do Secador 8, Comporta, Portugal

Parte 1: 5 a 30 de julho
Parte 2: 2 a 28 de agosto

Visitação
Terça à domingo
11h — 14h | 17h — 21h


Projeto Especial


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Press release (PT)

Press release (EN)

Anderson Borba | Audrey Gair | Belén Uriel | Buhlebezwe Siwani | Calvin Marcus | Carolina Pimenta | Carrie Moyer | Cristiano Lenhardt | Daniel Dewar & Grégory Gicquel | Eduardo Paolozzi | Efrain Almeida | Enzo Cucchi | Erika Verzutti | Gabriel Chaile | Jaime Welsh | Janaina Tschäpe | Javier Barrios | Jean -Marie Appriou | Joanna Piotrowska | João Maria Gusmão | Jos De Gruyter & Harald Thys | Koenraad Dedobbeleer | Leda Catunda | Loïc Raguénès | Luis Lázaro Matos | Luiz Zerbini | Marguerite Humeau | Marina Pinsky | Mauro Restiffe | Pablo Echaurren | Renato Leotta | Rivane Neuenschwander | Rodrigo Hernández | Rodrigo Matheus | Sarah Morris | Sebastian Black | Sergej Jensen | Sheroanawe Hakihiiwe | Simon Evans™ | Tiago Carneiro da Cunha | Valeska Soares | Yuli Yamagata

Clearing, Fortes D’Aloia & Gabriel e Madragoa têm o prazer de anunciar I Could Eat You, uma exposição colaborativa na Casa da Cultura da Comporta, em Portugal, com trabalhos de artistas representados e a participação especial de dois artistas convidados. Esta é a segunda edição de mostras de arte contemporânea na região histórica de Comporta durante a temporada do verão europeu.

 

 

I Could Eat You 

Por Sara De Chiara

 

I Could Eat You parte do fenômeno da “agressão fofinha” (“cute aggression” no original em inglês), um termo cunhado por psicólogos para definir o impulso que algumas pessoas sentem de apertar ou morder seres fofinhos, embora sem a intenção real de machucá-los. É o exemplo de uma expressão emocional dismórfica: a reação agressiva não parece corresponder à experiência de ternura que a ativa. Em lugar de um assalto violento, “eu poderia te comer” evoca um tipo de aniquilação mais próxima da absorção corporal de objetos de desejo — como sugere a metáfora do comer à qual a expressão recorre.

 

Quando em referência a um trabalho de arte, a expressão poderia sugerir o processo de osmose entre a matéria e o corpo do artista que dá forma a um conceito abstrato — algo que sempre implica um contraste —, mas também pode sinalizar aquele complexo mecanismo que o trabalho desperta no espectador que se relaciona com ele. A complacência estética voltada a imagens cativantes é contrabalanceada por camadas de significados, lutas, tentativas e experiências pessoais que vivem abaixo da sua superfície sedutora. Essa presença, uma aparência intrigante, cria uma tensão que faz com que o trabalho seja complexo, multifacetado, completo. Para além da tensão expressa pela ideia de “agressão fofinha”, a expressão I Could Eat You [Eu poderia te comer] parte de uma série de referências cruzadas, que vão desde a atração sexual até um protagonismo exagerado ou uma competição pessoal; desde a ideia de consumo rápido até o prazer de comer. Esses temas se desenrolam nos trabalhos reunidos na presente mostra, exibidos em uma apresentação arquitetônica original que remete às típicas toalhas de mesa encontradas nas tascas portuguesas.

 

Várias esculturas na exposição representam uma fauna diversa: os pássaros de bronze pintados de Efrain Almeida, as enormes mariposas de vidro soprado de Jean-Marie Appriou, as arraias-mantas de cerâmica de Luis Lázaro Matos, que convidam os espectadores a mergulharem nas profundezas do oceano, ou as peças de Daniel Dewar & Grégory Gicquel, que contrastam lesmas meticulosamente talhadas em madeira e insetos bordados em almofadas usando uma máquina de costura que reproduz a velocidade agitada típica dos insetos. Entre as esculturas também está o trabalho mais antigo em exibição: Seagull and Fish [Gaivota e Peixe] (1946), uma rara peça de concreto do pioneiro da Pop Art britânica  Eduardo Paolozzi. Uma carapaça branca surge na superfície de um tecido de lantejoulas também brancas em Ivory Crab [Caranguejo de Marfim] (2018) de Sergej Jensen, que difere da produção normalmente abstrata do artista ao revelar traços figurativos, porém misteriosos. Como espessas sombras, formas enigmáticas são projetadas nas grandes impressões fotográficas inkjet de João Maria Gusmão, que preservam apenas algumas características reconhecíveis, e estabelecem um paralelo com as esculturas de madeira bruta de Anderson Borba, que fazem uma referência sutil a formas antropomórficas. Criaturas de um bestiário ficcional habitam as coloridas tapeçarias de Rivane Neuenschwander, assim como os desenhos e as pinturas de Javier Barros, enquanto figuras híbridas do homem-natureza ou do homem-máquina ganham vida nas esculturas de papel machê e nas pinturas de Rodrigo Hernández, que fazem referência a imaginários da vanguarda histórica.

 

Com muita ironia e um charme típico de quadrinhos, os trabalhos em vidrado cerâmico da série Fish in Dish [Peixe no Prato] de Calvin Marcus trazem uma fusão entre os temas do animal e da comida, que é outro motivo recorrente na exposição. Frutas artificias coloridas compõem equilibrados sistemas planetários nas assemblages de Rodrigo Matheus; formas animais, ovos, frutas e vegetais se tornam novas unidades composicionais no trabalho de Erika Verzutti, estabelecendo um diálogo com modelos tradicionais e, ao mesmo tempo, desafiando suas hierarquias. Em sua prática, Gabriel Chaile evoca o comer como um ritual coletivo, que é também reivindicado como uma leitura alternativa e irônica do estereótipo da fertilidade em imagens antigas de figuras femininas no conceitualismo afiado de Marguerite Humeau, enquanto uma visão mais visceral e escatológica é explorada por Yuli Yamagata, em suas esculturas e relevos macios que brotam do espaço. Pinturas almofadadas, cobertas com diferentes tecidos e imagens pop, também aparecem no trabalho de Pablo Echaurren, um dos protagonistas dos movimentos da contracultura italiana dos anos 1970. A tensão entre o papel-alumínio e o tecido organicamente tingido também está presente nas pinturas expandidas de Cristiano Lenhardt.

 

A relação entre escultura, design, arquitetura, sistemas de exibição e bens de consumo é explorada por Koenraad Dedobbeleer e Belén Uriel, em referência à comida e ao corpo, respectivamente. O corpo é fundamental na prática de Janaina Tschäpe que, por meio do uso de bastões de tinta a óleo propaga seus gestos na tela. O corpo — ou a ausência dele — exerce um papel central nos trabalhos fotográficos reunidos na mostra: às vezes eles capturam o momento (Mauro Restiffe e Carolina Pimenta), outras vezes são o resultado de gestos performativos (Joanna Piotrowska) ou de uma elaborada pós-produção (Jaime Welsh). A tensão entre o corpo e a paisagem está presente no trabalho de Renato Leotta, que nos oferece o registro de uma paisagem natural ao representar a experiência imersiva da paisagem na qual o próprio artista vive. Elementos inspirados pela natureza se tornam caracteres de um novo alfabeto nas monotipias de Sheroanawe Hakihiiwe; padrões estilizados nas telas de Loïc Raguénès; pequenos círculos no trabalho de Audrey Gair; enquanto uma luxuriante flora tropical, com seus pontos de luz e sombra, triunfa nas pinturas e monotipias de Luiz Zerbini.

 

Oscilando entre o figurativo e o abstrato, temos os trabalhos de Sebastian Black, no qual formas sinuosas revelam detalhes corpóreos e círculos pretos são como olhos que encaram o visitante; as obras de Sarah Morris, que seguem rigorosas geometrias; os trabalhos de Marina Pinsky, nos quais a conexão com a arquitetura que os inspirou persiste apenas em suas proporções; e os trabalhos de Carrie Moyer, que brincam com cores e texturas sobrepostas, vernizes e camadas grossas, dando à tela um efeito polimérico e tridimensional. Guiadas por uma veia narrativa, temos a paisagem circular de Carneiro da Cunha despertada por visões místicas e as pinturas de Enzo Cucchi — um dos grandes exponentes da transvanguarda italiana dos anos 1980 —, que fazem uso de um elaborado repertório de visões e símbolos, incluindo desde caveiras até prismas e barcos a vela.

 

Em sua produção colaborativa que embarca mais de 30 anos, Jos de Gruyter e Harald Thys exploram um universo contemporâneo obscuro, enfatizando temas tais como os processos de despersonalização e a relação entre o ser humano e a mercadoria, numa espécie de encenação de um teatro do absurdo impregnado de humor sinistro. A análise da sociedade contemporânea também aparece refletida na produção de Simon Evans™, na qual restos, como simples materiais e pedaços de papel, tornam-se diagramas, entradas em diário e imagens arquitetônicas que revelam as preocupações do duo de artistas sobre as falhas e desigualdades do mundo. De uma forma mais introspectiva, Valeska Soares se ocupa de um repertório de temas trazidos da sua pesquisa atual sobre gêneros canônicos da pintura, muitas vezes opondo conceitos no mesmo trabalho, explorando associações diversas, tais como prazer e dor, memória e esquecimento, completude e ausência. Outra prática que examina o tempo presente é o trabalho de Leda Catunda. Por meio da apropriação de estampas de roupas e tecidos desde os anos 1980, a artista capta a voracidade imaginativa do nosso tempo, lidando com imagens que habitam o gosto popular e mapeando identidades e subculturas definidas pelo consumo, sem medo de cair no kitsch ou na estética “camp” ou mesmo na estética “fofa” — pois foram essas mesmas imagens populares que, apesar das sensações conflituosas que geram, nos nutriram até aqui.

Imagens

Vistas da exposição
Obras

Vistas da exposição

Obras