Mauro Restiffe
Rastro traço laço
18 Nov 2021 – 5 Feb 2022
Abertura
18 Nov, 17h–20h
Galpão
Rua James Holland 71
São Paulo
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A Fortes D’Aloia & Gabriel tem o prazer de apresentar ‘Rastro traço laço’, um desdobramento da compreensiva exposição individual de Mauro Restiffe no Galpão, em São Paulo. A mostra apresenta um novo grupo de retratos selecionados a partir do arquivo que vem sendo compilado pelo artista há 30 anos.
A inconstância do olhar sobre o mundo
Por Bernardo José de Souza
Voltar a uma obra fotográfica é como voltar a um texto, recuperar o que havia sido desprezado entre um pensamento e outro, encontrar pela primeira vez o que a pressa havia deixado passar desapercebido — um exercício de convivência, interpretação e afetação, emotiva num primeiro momento, e intelectual, justo a seguir.
Retornar aos retratos de Mauro Restiffe, motivado pela nova seleção de imagens feita para este segundo tomo da exposição Laço, Rastro, Traço, abre a possibilidade de perscrutar um passado que, embora alheio à minha história, vem despertar um forte instinto de familiaridade, ou mesmo o desejo de dividir espaço e atmosfera com seus muitos personagens à deriva no tempo. É como se coubesse a mim, e a qualquer visitante, tomar de empréstimo essas fotografias fugazes, repletas de um sentido oculto; como se elas acenassem com uma narrativa esquecida por conta de uma dessas peças que a memória de quando em vez nos prega, borrando inteiras passagens de uma biografia.
As flores amealhadas nesse conjunto de instantâneos funcionam como as famosas madeleines de Proust, o sortilégio disparador de um afeto sublimado — responsáveis por jamais fazer perecer uma lembrança que pensávamos extraviada pela vida. Entre novas despedidas, hesitações ou sinais trocados, estas quinze imagens compõe todo um arcabouço afetivo, muitos, aliás, pois entre errâncias, portos seguros e finais de linha, recomeçam as jornadas, senão a cada dia, de ciclo em ciclo, como se arrastados pela torrente vital que nos põe em ação, no mundo.
Talvez o mais belo dessas fotografias seja a possibilidade de abrir fendas no espaço/tempo, embarcar em digressões tão íntimas quanto universais em seus pontos dispersos numa constelação de vidas cruzadas, dimensões simultâneas de encontros e abandonos. E, assim, flertamos com a alteridade, como se postos em pé de igualdade: por uma vez, todos humanos. Há algo de J. L. Borges neste exercício especular, este mundo dentro de outro mundo, como o personagem do seu conto as Ruínas Circulares, no qual um homem em meio a um templo, embrenhado na mata, sonha um outro homem buscando torná-lo realidade, mas logo acaba por descobrir ser ele, também, o sonho de outro homem.
São tantas e quantas as realidades imediatamente perdidas nesses últimos anos. E não me refiro apenas à morte, mas ao desaparecimento de inteiros complexos afetivos, ou mesmo semânticos — sinapses que jamais voltarão a ocorrer porque a vida mudou, porque todo um mundo parece ter sido irremediavelmente solapado. Talvez em outro tempo, eu passasse apressado por esta revoada de imagens, mas hoje me encontro a ponto de naufragar nas ilhas de memória do dia anterior, de um mundo avant ce monde, avant la lettre — antes da carta de despedida que voltamos a ler com o entusiasmo de recuperar o que a urgência nos havia roubado.
Mauro Restiffe (São José do Rio Pardo, Brasil, 1970) vive e trabalha em São Paulo, Brasil. Entre suas exposições individuais recentes destacam-se: History as Landscape, OGR (Turim, Itália, 2019); São Paulo, Fora de Alcance, Instituto Moreira Salles (Poços de Caldas, Brasil, 2019; São Paulo, Brasil, 2018; Rio de Janeiro, Brasil, 2014); Álbum, Estação Pinacoteca (São Paulo, Brasil, 2017); Post-Soviet Russia 1995-2015, Garage Museum of Contemporary Art (Moscou, Russia, 2016). O artista participou de diversas mostras coletivas, incluindo: Gwangju Biennial (Gwangju, Coréia do Sul, 2018), Aichi Triennial (Nagoya, Japão, 2016); Bienal de Cuenca (Equador, 2014); Bienal de São Paulo (São Paulo, Brasil, 2006); e Panorama de Arte Brasileira (São Paulo, Brasil, 2013 e 2005).